"(...)
Sinto o vento, respiro o silêncio, interrogo o ser. Penso de uma outra maneira.
A natureza é um templo a que aquele santuário nos conduz.
Nela, nele, o milagre. O milagre do Senhor dos Milagres. O mistério, afinal.
O mistério é, de uma só vez, o vazio silencioso do abismo e a plenitude impenetrável da floresta: o vale, a sombra, o horizonte, o longínquo, a bruma. O mistério está na sedução do corpo e na inacessibilidade da alma; na voz, no olhar, no gesto, na paixão. O mistério é a natureza, o universo, Deus e o Ser. O mistério não pode ser visto, ouvido ou dito. Quando muito, tocado. O mistério é-o na exacta medida em que a sua expressão já não o diz, ou seja, ele escapa-nos a partir da sua e da nossa própria voz.
Dizer o mistério é o mesmo que o declarar, logo, é o mesmo que destruí-lo. Não o podemos possuir porque não o podemos desvendar um só instante. O mistério não se deixa ver: se o víssemos, ele cegava-nos antes de destruir a sua condição.
O mistério arrasa-nos e motiva-nos. Ele é enorme, incomensurável até, mas é também belo e envolvente. Surpreende-nos. Pode, então, atrair-nos como uma vertigem. Mas, perante o mistério, mesmo quando agimos, contemplemo-lo. O mistério torna-nos místicos.
(...)"
Carvalho, Adalberto Dias de (2000). A Contemporaniedade como Utopia. Porto: Edições Afrontamento.
Etiquetas: na mesa
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