O meu anjo...
IAH-HEL
O Anjo: Este anjo ajuda a obter sabedoria, auxilia no aparecimento de idéias luminosas e a apaziguar a violência do mundo. Favorece as pessoas para que vivam de modo correto e honesto.
Influência: Quem nasce sob esta influência amará a tranqüilidade, a nobreza de caráter e a solidez de atitudes. Cumprirá fielmente todos os deveres e obrigações para consigo, sua família e comunidade. Praticará vários esportes, podendo largar tudo caso comece a aborrecer-se; terá a mesma postura quando isso acontecer em relação ao amor. É evoluído espiritualmente e sabe aproveitar sua energia, para seu próprio crescimento e para o bem da humanidade. Pensa mais nos outros do que em si próprio. Desde criança demonstra segurança em seus atos e sabe controlar suas ansiedades. Líder nato, aceita os convites de comando que recebe por seu jeito forte, capacidade de improvisação e apreço aos desafios. Tático, busca sempre uma vitória imediata; ganha todas as batalhas. Será forte para suportar todas as situações que são adversas à sua estrutura emocional e sabe que o único meio para atingir seus objetivos, é a insistência. Luta por uma imagem digna, transparente e verdadeira. As pessoas novas que conhece nas inúmeras viagens de lazer ou trabalho, são consideradas "experiências" que sempre enriquecem seu mundo íntimo, cada dia mais repleto de luz. É um ótimo mestre, que obtém vitória por ser o que é - simplesmente amor.
Profissionalmente: Poderá ser um atleta, professor de ginástica ou de qualquer outro esporte, dono de academia. Por sua facilidade para o comando, se entrar para a política, provavelmente será líder de partido ou de governo. Poderá ainda ser administrador de empresas, empresário ou economista.
Anjo Contrário: Domina as condutas escandalosas, a depravação, a futilidade, o luxo (gastos imensos com jóias, roupas, muitas vezes sem condições financeiras). A pessoa sob a influência deste anjo contrário terá inconstância nos relacionamentos, interessando-se somente pelo dinheiro. Provocará intrigas contra casais, induzindo-os a brigas com maus conselhos.
O que é um Anjo Contrário?
Dizem que alguns anjos sentiram ciúmes de Deus e se rebelaram. Apaixonaram-se pelas filhas de Noé e como transgrediram as leis, foram condenados a ficar presos no mundo inferior (inferi), nesta força ativa, impensada, de fogo.
O anjo contrário atua quando você não pensa, age por instinto. São os animais que agem por instinto. A besta representa a ausência de raciocínio, a preguiça. Diabo - Dividido: Confusão.
A intenção do anjo contrário é destruir seu lado forte, deixando-o fraco e tornando mais fácil a sua ação. Um exemplo da ação do anjo contrário, é quando você vai falar alguma coisa para alguém e fala outra muito diferente. Você tem certeza que está sob a ação do anjo contrário, quando algo acontece na família e você começa a fazer julgamentos e a brigar sem compreender. Lembre-se: Deus não julga.
Adão é representado por uma árvore (da vida), cujo tronco representa a humanidade, os galhos as raças e as folhas os indivíduos. Os maus são as folhas secas, ressentidas e invejosas que caem, transformando-se em adubo e fortificando a árvore, que assim fornecerá frutos mais bonitos e saborosos. Os cabalistas hebreus chamavam os anjos contrários de "cascas". Da mesma forma que a casca grosseira de uma árvore, mesmo tornando-a feia, protege-a contra pragas e intempéries preservando sua seiva, a energia do anjo contrário pode ser revertida em seu benefício, se você pensar, raciocinar, isto é, estiver perto de Deus.
Alguns seres humanos quando perdem o corpo (a matéria), não se despojam da vibração energética do instinto, ficando presos no mundo inferior, até que uma "batalha" espírito/alma/inteligência, consiga a elevação, orientada pelo anjo de guarda.
Certa vez num debate, me perguntaram se o anjo de guarda poderia nos abandonar. Respondi afirmativamente e alguns discordaram da minha colocação. Mas pense, o anjo de guarda não poderia estar ao lado do assassino de uma criança, ou de um seqüestrador, ele estaria compactuando com essas ações horríveis.
Texto extraído dos livros Anjos Cabalísticos e A magia dos anjos cabalísticos de Monica Buonfiglio
Ana Hatherly
II - Canto-te
Canto-te para que tu definitivamente
existas
Canto o teu nome porque só as coisas cantadas
realmente são e só o nome pronunciado inicia
a mágica corrente
Canto o teu nome como o homem fazia eclodir
o fogo do atrito das pedras
Canto o teu nome como o feiticeiro invoca
a magia do remédio
Canto o teu nome como um animal uiva
de
Como os animais pequenos bebem nos regatos depois
das grandes feras
Canto-te
e tu definitivamente existes nos meus olhos
Sempre abertos porque é sempree os meus olhos
são os olhos da criança que nós somos sempre
diante da imensidão do teu espaço
Canto-te
e os meus olhos sempre abertos são a pergunta
instante pendente de eu te interrogar
e interrogo as coisas em seu ser noctumo
em seu estar sombriamente presentes na tua claridade
obscura
E como é sempre
meus olhos abertos prescrutam-te
símbolo de tudo o que me foge
como apertar o ar dentro das mãos
e querer agarrar-te
oh substância
Canto-te
com a fragilidade de tudo que existe perante
uma eternidade demasiado nocturna para os nossos
olhos infantis perante a tua antiguidade
futura
E a nossa voz é uma pequena onda no dorso
do teu oceano de matéria
Um leve arrepio apenas na espantosa espessura
de teu éter
Ah no ar é que tudo acontece
no ar nocturno das idades esquecidas
que previamente desconheceremos
No espaço é que tudo acontece
e o espaço é uma grande muito quieta
onde os nossos olhos penetram
no não sabermos até onde
ali
além
no além onde tudo acontece
Oh
oh espaço de tudo ser tão ligeiro e impalpável
e sermos nós a respiração da
teu bafo ritmado
imperceptível distância
Oh augusta majestática dignidade do silêncio
Oh impassibilidade da tua mecânica celeste
Oh organismo primeiro de todos os fins secretos
da compreensão das coisas
Oh inorgânico organismo dos seres
que se devoram
Oh diz
a quem servimos nós de pasto
Canto-te
como quem pronuncia o Mantra esotérico do teu nome
Canto-te e grito
para que a poeira que se infiltra em todas as
coisas se erga de ti como um plâncton
Oh Madre
matriz das criaturas inferiores que rastejam
a teus pés cobertas de pó
esse pó que a cada momento ameaça submergir-nos
Oh aranha enorme tecendo tua teia de pó
Oh que desintegras tudo e tudo tu constróis
Ah como nós lambemos tuas duras mãos
Oh que fustigas nossos olhos com tua sombra
Enorme
Oh
que deixas tanto espaço para o silêncio
das mil pétalas
dos mil braços esplendorosos em seu abandono
dos murmúrios
dos afagos
sangue derramado sobre o mundo
Oh
Porque és sempre tão premente?
e sempre estás ausentemente
na tua constância em todas as coisas?
Oh sono
Oh morte tão desejada e longa
mágica povoada de átomos
milhões de espíritos enchem o teu sopro
E penetras em nós como uma bala
E tudo morre quando tu chegas
E tudo se dilui e se transforma em ti
alada presciência de tudo acontecer
tão longe de nós e tão antigamente
e tudo nos ultrapassar com soberana indiferença
ante os nossos olhos cegos pelo teu negrume
Oh
brilha para dentro de mim
Acende teus luzeiros em meus olhos
Ergue teus braços oh prenhe de tudo
Oh vaso
Oh via láctea de nos amamentares com teu leite
de sombra
Oh úbere e pródiga
Aleita tua ninhada faminta
Grande fera luzidia
Grande mito
Grande deus antigo
Oh urna onde todos dormimos
Oh
Meus olhos choram já de tanto prescrutar-te
E canto-te
Canto-te
Para que tu existas
E eu não veja mais nada além de ti
E nada mais deseje senão que venhas outra vez
levar-me para dentro do teu ventre
de nunca mais haver
E nada mais haver que
Oh tu definitivamente além
Ana Hatherly
Poemas de Eros Frenético e Contemporâneos
um calculador de improbabilidades
Quimera
1ª edição 2001
BIOGRAFIA
Poeta, romancista, ensaísta e tradutora, Ana Hatherly iniciou a carreira literária em 1958.
Tendo sido um dos principais elementos do grupo de Poesia Experimental nos anos 60 e 70, o seu trabalho está representado nas mais importantes Antologias e Histórias da Literatura Contemporânea de Portugal, Brasil, Espanha, Inglaterra, Alemanha, Estados Unidos, Dinamarca, Suécia, Holanda, e República Checa.
É também autora de várias traduções para português de obras inglesas, francesas, italianas e espanholas.
Durante as últimas duas décadas, tem-se dedicado ao estudo da literatura portuguesa e espanhola do "Siglo d'Oro", tendo publicado vários ensaios e comunicações sobre o tema em várias das mais conceituadas publicações literárias de Portugal e do estrangeiro.
Licenciada pela Universidade de Lisboa e Doutorada em Literaturas Hispânicas pela Universidade de Berkeley (U.S.A.), é actualmente Professora Catedrática de Literatura Portuguesa na Universidade Nova de Lisboa e Presidente do Instituto de Estudos Portugueses da mesma Universidade. É ainda membro da Direcção do PEN Club, de que já foi Presidente.
Referenciada, a nível poético, como um dos nomes mais importantes das vanguardas portuguesas da segunda metade do século, a sua poesia reúne fortes tendências barroquizantes e visuais que a têm já levado a um apagamento de fronteiras entre expressão poética e intervenção plástica. É esse o caso, por exemplo, de Mapas da Imaginação e da Memória (1973), bem como das várias exposições que incluem desenho, pintura e colagem, realizadas em galerias e centros de exposições, como o Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, Museu do Chiado e Fundação da Casa de Serralves, para além das participações na Bienal de Veneza e Bienal de S. Paulo (Brasil).
fonte: Ministério da Cultura e Instituto Português do Livro e da Leitura
GERTRUDE STEIN - qd paris era uma festa
UM POEMA DE GERTRUDE STEIN
from Before the Flowers of Friendship Faded Faded
I love my love with a v
Because it is like that
I love my love with a b
Because I am beside that
A king.
I love my love with an a
Because she is a queen
I love my love and a a is the best of them
Think well and be a king,
Think more and think again
I love my love with a dress and a hat
I love my love and not with this or with that
I love my love with a y because she is my bride
I love her with a d because she is my love beside
Thank you for being there
Nobody has to care
Thank you for being here
Because you are not there
"Quem apareceu primeiro, Gertrude Stein ou James Joyce? Não se esqueçam que o meu primeiro grande livro, «Three Lives», foi publicado em 1908. Muito antes de "Ulisses". Não nego que Joyce fez qualquer coisa mas a sua influência é apenas local. A sua hora já passou tal como aconteceu com Synge, outro escritor irlandês."
Estas linhas foram escritas por Gertrude Stein, em 1924. Apesar de ter errado em relação a James Joyce ( como aconteceu, aliás, com Virginia Woolf), a verdade é que ela tinha a perfeita noção do seu lugar de pioneira da chamada "ficção experimental" e do impacto que a sua escrita e a sua personalidade iriam ter em muitos dos seus contemporâneos e nas gerações que se seguiram
De Gertrude Stein é comum dizer-se que "descobriu " Picasso, que inventou a expressão "geração perdida", aplicada a Hemingway e Fitzgerald, que aconselhou Paul Bowles a dedicar-se à música e que se considerava um génio. Sabe-se também que possuía uma das maiores e mais ricas colecções de arte do século XX e que essas obras se encontram, agora, espalhadas por vários museus. No seu apartamento, em Paris, acotovelavam-se personagens do mundo artístico e da sociedade da época: Braque, André Masson, Tristan Tzara, Marcel Duchamp, Jean Aron, Djuna Barnes, Nancy Cunard são alguns dos nomes constantes de uma lista interminável referenciada por Linda Wagner-Martin na biografia "Favored Strangers. Gertrude Stein and her Family" (400 págs., November 1997, Rutgers University Press).
Em 1999, cento e vinte e cinco anos depois do seu nascimento, sucederam-se as manifestações de apreço, análise, recuperação da sua obra: teatro, ficção, poesia, biografia, ópera. O século passado terminava, assim, com uma "revisão da matéria" lançada aos ventos por Stein. A partir do estudo da sua obra e personalidade, noções como modernismo e pós-modernismo, etnicismo, lesbianismo, elitismo, estética, nunca mais foram as mesmas.
Gertrude Stein nasceu a 3 de Fevereiro de 1874 em Allegheny, Pennsylvania, Estados Unidos e passou a maior parte da infância entre Viena e a Califórnia. De acordo com as recordações de uma tia, "aos catorze meses andava sozinha, imitava e repetia tudo." Tinha oito anos quando começou a escrever, uma actividade que rapidamente se transformou em obsessão, tal como a leitura. As suas preferências iam para Shakespeare e para livros de História Natural. Na escola mostrou imediatamente o fascínio que sentia pela estrutura das frases.
Em 1893 entrou para o Radcliffe College mas, em 1903, instalou-se em França com o irmão, Leo, depois de ter passado por um curso de medicina na Universidade Johns Hopkins e de ter experimentado o estudo de psicologia com William James, com quem desenvolveu uma relação estreita e privilegiada ao ponto de, num belo dia de Primavera, escrever no topo da página de um exame: "Querido Professor James. Espero que me perdoe mas hoje não me apetece nada fazer um exame de filosofia."
Gertrude e Leo, munidos de uma generosa mesada facultada pelo irmão mais velho depois da morte do pai, tornaram-se rapidamente o centro da actividade cultural, em Paris. Leo era pintor e crítico de arte mas acabou por se tornar um neurótico incurável, paralisado por desordens alimentares e pela surdez, a que se juntou um "bloqueio" artístico e um ruinoso fetichismo por sapatos. Em "Sister, Brother" (Ed. Putnam) a biógrafa Brenda Wineaple traça o perfil destes dois irmãos ligados por sentimentos profundos e uma feroz interdependência, agravada pela morte da mãe quando Gertie tinha catorze anos e Leo dezasseis.
Em Paris desenvolveram uma relação estreita com Picasso e, simultaneamente, com o seu grande rival, Matisse. Braque, Van Dongen, Derain e Juan Gris, também faziam parte do círculo de amigos íntimos, sendo este ultimo o favorito de Stein. Para além de pintores o famoso n.º 27 da rue de Fleurus acolhia, regularmente, todas as semanas, a visita de Apollinaire, Max Jacob, André Salmon, Erik Satie, Jean Cocteau, Sherwood Anderson, Ernest Hemingway, Scot Fitzgerald. Gertrude gostava de reunir a sua "corte de génios", presidida por ela própria. Mas havia quem lhe resistisse como, por exemplo, James Joyce que afirmava "detestar mulheres intelectuais" e, em certa medida, Djuna Barnes, a sua rival na escrita, que preferia frequentar a companhia de Nathalie Barney e do seu grupo de lésbicas sofisticadas. Gertrude nunca gostou de Joyce, que considerava um trapaceiro, e irritava-se por ele não se vergar perante a sua forte personalidade e por não se mostrar agradecido pelo facto de ela o ter incluído no seu grupo de convidados que incluía "discípulos" obedientes como Hemingway de quem ela dizia : "Fui eu que o ensinei a escrever."
Em 1907, Stein começou a viver com Alice B. Toklas, uma amiga dos seus tempos de S. Francisco. Foi uma união muito feliz que durou todo o resto da vida da escritora ( Gertrude morreu a 27 de Junho de 1946 e Alice sobreviveu-lhe 21 anos) e que foi amplamente documentada em "Autobiografia de Alice B. Toklas", escrita pela própria Gertrude Stein, aos cinquenta e oito anos, numa altura em que decidiu afastar-se do seu estilo mais rebuscado e escrever algo simples e corriqueiro. A narrativa era-lhe, supostamente, ditada pela sua companheira por esta "estar demasiado ocupada com os problemas caseiros do dia-a-dia"
"Robinson Crusoé" de Daniel Defoe serviu de modelo para esta "autobiografia" em que Stein se divertiu a designar-se como "génio" e a descrever os detalhes mais íntimos da vida de todos os dias, com as festas, os jantares, as exposições, os amores, ódios, zangas e reconciliações de amigos, inimigos ou simples conhecidos.
Gertrude Stein afirmou que não queria que as emoções ditas "femininas" dominassem a sua vida, preferindo ser ela a dominar o mundo (daí a sua imagem iconográfica muito utilizada pelas suas admiradoras, na qual a sua cabeça, de perfil, se assemelha à de César), reproduzindo-o nos seus escritos e reprimindo sempre a eventual primazia da emoção. A única paixão permitida era reservada à escrita, uma afirmação transmitida, à sua maneira, muito peculiar, através da voz de Toklas na "Autobiografia" : "(Ela) sabe que a beleza, a música, os adornos, até mesmo acontecimentos, não deveriam ser a causa de emoção nem deveriam servir de material para poesia ou prosa. Nem mesmo a emoção per si deveria ser a causa de poesia ou prosa. Estas deveriam consistir numa reprodução exacta de uma realidade, tanto interior como exterior".
Quando Gertrude e Alice começaram a viver juntas, a primeira tinha acabado "Three Lives", um conjunto de três histórias (retratos) de três mulheres e trabalhava numa obra monumental baseada na sua própria família a que chamou " Making of Americans". O momento foi especialmente dramático porque se tinha separado definitivamente de Leo, com quem se mantinha em estado de guerra declarada por ele não apreciar os seus escritos. Zangaram-se e nunca mais se falaram. Gertrude, que fora educada por um pai tirânico, ao lutar raivosamente com o irmão que adorava, para impor a sua identidade como escritora, criava uma barreira entre ela e o "mundo masculino ". O mais interessante é que, como é possível constatar através da já referida "Autobiografia", era Stein quem assumia o papel de marido no casal, "escrevendo e discutindo arte com os homens", enquanto Alice cozinhava e tratava da casa e "se sentava a conversar sobre chapéus e roupas com as mulheres dos artistas que vinham de visita".
"Theree Lives", o estranho livro que Stein escreveu em 1905, foi concebido, segundo ela, a partir de um quadro de Cézanne que os dois irmãos tinham adquirido no inverno anterior. É a história de Anna, Lena e Melanctha, esta ultima considerada por Richard Wright como "a primeira narrativa longa e séria sobre a vida dos negros, nos Estados Unidos", onde se acumulam detalhes psicológicos e cenas da vida quotidiana que a escritora observava durante os seus passeios a pé em Montmartre,
quando ia e vinha de e para o "atelier" de Picasso, onde quase todos os dias posava para o seu famoso retrato.
A influência de Cézanne na sua obra deu origem ao seu estilo repetitivo e hipnótico e ao "cubismo na literatura" a que ela chamava o seu próprio " método de composição". Este assentava nos seguintes princípios: "...começar sempre de novo, sempre, sempre, "usar tudo" e "utilizar um presente contínuo". Em Cézanne, ela admirava a técnica a paciência e o método bem como o facto de, na composição, os detalhes terem tanta importância como o todo.
Gertrude foi uma escritora incansável. Os editores ficavam chocados com a sua pontuação, com as suas frases inacabadas que eram retomadas mais adiante, com as suas repetições. Ela dizia que tanto fora influenciada pelo cubismo como por Mark Twain o que marcava a sua relação com a cultura americana, apesar de ter vivido quase toda a vida na Europa. Em 1933, numa viagem aos Estados Unidos, durante a qual proferiu palestras e conferências, foi acolhida triunfalmente em todo o lado, chegando a ser recebida na Casa Branca com pompa e circunstância.O seu cosmopolitismo e desenraizamento contribuiram para estabelecer o mito de Paris como centro cultural de eleição para infindáveis gerações de americanos, sem nunca deixar de enaltecer as virtudes do seu país natal. Escreveu que, "...(os Estados Unidos), ao começarem a criação do século vinte nos anos sessenta do século dezanove, tornaram-se o país mais antigo do mundo".
Fisicamente, Gertrude era a típica matrona germano-americana, de corpo e traços fortes, uma figura que nada tinha de feminino. Mas o seu humor, o seu sentido de auto-estima e o seu espírito finamente irónico, aliados ao facto de ser extremamente mundana e muito "snob", faziam dela uma personagem muito atraente. Hemingway descreveu-a assim: "Mademoiselle Stein tinha uma constituição pesada, como a de uma camponesa... com uns belos olhos e um rosto germano-judeu que... fazia lembrar o das mulheres do campo do norte de Itália, com as suas roupas, o seu rosto sempre móvel e o seu adorável cabelo, espesso, vivo, como o das imigrantes. " Quanto a Alice, "uma gárgula amigável" foi descrita por Hadley Hemingway como, "...um pedaço de fio electrificado, magra e pequena, com ar de espanhola e olhos muito escuros e penetrantes." Mabel Dodge, uma amiga de Gertrude fez o seguinte comentário em relação à sua aparência: " era atraente de uma forma positiva e generosa, apesar da sua amplitude física. Parecia apreciar a sua própria gordura, uma atitude que é sempre uma ajuda, no sentido de se ser aceite por outras pessoas. Não possuía nem um traço daquele embaraço tonto que os anglo-saxónicos demonstram em relação à carne. Ela glorificava a sua."
Em "Paris é uma Festa", Hemingway conta que não foi capaz de a encarar uma vez em que teve de esperar no salão do apartamento, enquanto ouvia gemidos e suspiros, no quarto situado mesmo por cima. Só a ideia das duas damas embrenhadas num acto sexual bastante activo, fizeram-no bater em retirada. Mas Hemingway era um misógino e o seu machismo tinha de ser arvorado de uma forma óbvia que também passava pela repulsa em relação ao lesbianismo.
Virginia Woolf, Willa Cather, Colette e Gertrude Stein apresentam entre si certas semelhanças num universo romanesco em que a "sedução maternal" é o reflexo de uma visão muito feminina do universo do amor. Embora com personalidades diferentes, elas representam uma ideia de sucesso entre as "mulhers de letras". Todas elas tiveram a liberdade de produzir os seus escritos, alcançando uma enorme mestria na utilização das suas linguas maternas. Também foram capazes de disfrutar um certo conforto, ao lado de companheiros e companheiras que se preocuparam em fornecer-lhes condições para trabalharem. Todas conheceram o sucesso em vida e gozaram plenamente esse privilégio, colocando a literatura à frente de tudo. É verdade que também escreveram sobre a maternidade mas, de todas elas, só Colette teve uma criança, já quando estava na meia idade ("Je suis un écrivais qui a fait un enfant" dizia ela quando se referia ao "acidente")
Gertrude Stein foi mais do que uma senhora ( com um ar bastante masculino ) que dava óptimas festas e entretinha os seus amigos e convidados com ditos espirituosos e inteligentes, ao mesmo tempo que os deliciava com os famosos cozinhados da sua companheira. Foi uma escritora que inovou em literatura e uma importante mentora da arte moderna. Diz-se que ela fez com as palavras o que Picasso fez com as tintas. Os seus escritos "impressionistas" nos quais utilizava termos que lhe eram familiares e que lhe suscitavam uma determinada reacção, tinham como finalidade descobrir um significado oculto, a sua verdadeira natureza. Para muita gente, ela maltratou a língua inglesa, abusou dela e "desfigurou-a". A sua intenção era criar uma nova linguagem em que a qualidade do verbo deveria ser intrínseca e não o espelho de uma imagem preconcebida. É famosa a sua frase, "Rose is a rose is a rose", na qual ela condensou toda a sua teoria: o sentido deveria surgir a partir da entoação do conjunto de palavras, fazendo emergir, do subconsciente, o significado perfeito até aí mergulhado nos recônditos da mente.
Gertrude Stein tem sido utilizada como ícone de grupos homossexuais. Um dos seu primeiros livros "Q.E.D." (Quod Erat Demonstrandum) ou "Things As They Are", que ela escondeu e fingiu ter esquecido durante anos, contava a história de um triângulo amoroso formado por três mulheres , uma das quais era uma imagem decalcada de si própria, no tempo em que estudava Medicina. Aliás, os seus biógrafos estão convencidos que a sua desisitência do curso na John Hopkins University ficou a dever-se às agruras de uma paixão e não, como ela disse, ao facto de se "aborrecer mortalmente".
O facto de mais tarde, em Paris, fazer questão de demonstrar abertamente que desafiava as convenções, contribuiu para uma admiração por parte das comunidades homossexuais. A sua qualidade de judia tão pouco a marcou com sinais de exclusão. Durante a Primeira Grande Guerra, tanto ela como Alice fizeram questão de ficar em Paris. Compraram um Ford em muito mau estado, a que chamaram "Auntie" e usaram-no para ajudar a Cruz Vermelha e transportar feridos para a província. Durante a Segunda Grande Guerra trabalharam para a Resistência, conseguindo que os ocupantes nazis nunca descobrissem que eram judias.
A imagem de Gertrude Stein ficará sempre associada ao retrato que Picasso fez dela: uma forma mais ligada à escultura do que à pintura, uma figura sólida, maciça, que nos olha com o ar remoto de um monge tibetano. A sua forte personalidade marcou indestrutivelmente todos os que com ela privaram. Adorava a escrita, acima de tudo (seguiam-se, na ordem dos seus afectos, Alice e os seus dois cães, Pépé e Basket) e procurou transformar o romance e a linguagem do século XX da mesma forma e com o mesmo génio que o seu amigo Picasso, em relação às artes visuais.
Morreu a 27 de Junho de 1946 e foi enterrada no cemitério Père Lachaise, em Paris. Dias antes, na cama do hospital onde estava internada, perguntara a Alice: "Qual é a resposta?" E, uma vez que a companheira não lhe respondeu, insistiu. " Então, qual é a pergunta?!". O seu humor e o seu génio permaneceram intactos até ao fim.
por Helena Vasconcelos
in storm magazine