segunda-feira, junho 25, 2007





"(...)
Sinto o vento, respiro o silêncio, interrogo o ser. Penso de uma outra maneira.
A natureza é um templo a que aquele santuário nos conduz.
Nela, nele, o milagre. O milagre do Senhor dos Milagres. O mistério, afinal.
O mistério é, de uma só vez, o vazio silencioso do abismo e a plenitude impenetrável da floresta: o vale, a sombra, o horizonte, o longínquo, a bruma. O mistério está na sedução do corpo e na inacessibilidade da alma; na voz, no olhar, no gesto, na paixão. O mistério é a natureza, o universo, Deus e o Ser. O mistério não pode ser visto, ouvido ou dito. Quando muito, tocado. O mistério é-o na exacta medida em que a sua expressão já não o diz, ou seja, ele escapa-nos a partir da sua e da nossa própria voz.
Dizer o mistério é o mesmo que o declarar, logo, é o mesmo que destruí-lo. Não o podemos possuir porque não o podemos desvendar um só instante. O mistério não se deixa ver: se o víssemos, ele cegava-nos antes de destruir a sua condição.
O mistério arrasa-nos e motiva-nos. Ele é enorme, incomensurável até, mas é também belo e envolvente. Surpreende-nos. Pode, então, atrair-nos como uma vertigem. Mas, perante o mistério, mesmo quando agimos, contemplemo-lo. O mistério torna-nos místicos.
(...)"


Carvalho, Adalberto Dias de (2000). A Contemporaniedade como Utopia. Porto: Edições Afrontamento.

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quarta-feira, junho 20, 2007





as memórias passadas transportam-se em rios de água




a água fresca da fonte traz até mim novos sentidos...

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terça-feira, junho 19, 2007

AMA E FAZ O QUE QUISERES!




1. Talvez de todos os desencontros com que nos brinda, desconfiemos (em segredo) que o amor seja um adereço paleolítico que se desencontrou com o desenvolvimento. Teimosamente, não se apresenta sob um formato normalizado. E, sem que se aperceba porquê, chega-nos mal embalado, sem código de barras e – pior – sem as datas de produção e de validade (o que, como compreendem, é uma ameaça, intolerável, para a saúde).
Para mais, há pessoas que se lamentam – com razão!... – de que o amor lhes chega mal acondicionado. Ou porque são premiados com a versão do «amor e uma cabana» (que, presumo, lhes permitirá ver estrelas, mas que, decerto, será responsável por resfriados e incriminantes rouquidões). Ou porque a versão rodeo as premiou com o banco de trás de um automóvel de baixa cilindrada (que desconcerta pelo cheiro a gasóleo ou pela companhia de uma folha de jornal injuriando a arbitragem). Ou porque na versão cool, o amor (...nas dunas) – não que saibamos por nós (é claro!), mas pelo que se ouve – é acompanhado por uma areia incontornável que nos sugere que o Paraíso é áspero, afinal.

2. O amor passou de moda.
Ainda sugere – a alguns resistentes – cartas de amor quando «o que está a dar» são os sms.
E faz-se de olhos nos olhos, quando a maioria das pessoas se insinua, diante do amor, pelo canto do olho.
E vive-se sem horas, lânguido e longamente. O que parece uma patetice, num tempo todo ele muito... fast-food. Salvo seja!...

3. Mas, meus amigos, o amor é a encruzilhada de sentimentos que nos separa da morte e da vida. E há, realmente, pessoas que nos viram do avesso, nos tiram as nuvens do olhar e banham de sol o nosso coração. Acerca delas falamos de amor, como se ele fosse um sentimento... Mas não é. É uma consensualidade de sentimentos. Daí que a tranquilidade do amor nos rebulice e, com ela, as estrelas se insinuem onde, dantes, dominava a indiferença que nos levava a guardar o melhor do mundo... sempre para mais tarde.

4. Talvez, só aí, ao descobrirmos tudo o que o amor não é, percebamos que o amor não é uma forma de ver o mundo com os olhos do outro. É mais! A redenção com que o amor se dá passa pela anunciação de encontrar, nos olhos do outro, uma forma de ver para além dos nossos olhos e dos dele.
O amor não é bem um encontro de verdades. É melhor! É confiarmo-nos a alguém e entregar, pela mão dos olhos dele, o nosso olhar ao desconhecido, guiados pela esperança de vir até nós «um infinito de nós dois».



Sá, Eduardo. (2003, Dezembro 7). Ama e faz o que quiseres!. Notícias Magazine, 602, 8.

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